terça-feira, 29 de junho de 2010


Quem conhece Abelardo e Heloise? E as características em comum do relacionamento vivido entre os dois com os romances do período do Romantismo? Neste pequeno texto esboço algumas considerações a respeito deste assunto: o amor real com a ficção dos românticos.

Espero que apreciem!



Na França do século XII, período em que os intelectuais não podiam se render ao amor sensual, um casal vive uma intensa paixão. São Abelardo e Heloise, o maior filósofo da França e uma linda jovem rica de 17 anos, sobrinha do clérigo Fulbert. Os dois se conhecem quando Abelardo é contratado para ser o tutor de Heloise, sendo, por que meio das aulas ambos se apaixonam e começam a viver um amor proibido para a época, pois Abelardo havia feito votos de castidade. Entretanto, isto não os impediu de viver a paixão a ponto de o clérigo Fulbert descobrir o romance e trancar Heloise em casa, período em que ela descobre estar grávida de Abelardo. Assim, ela é levada pelo amante para a cidade onde ele nasceu com o objetivo de ter o filho com segurança. Abelardo permanece na França lecionando e após um longo tempo visita Heloise e casa-se com ela contra o conhecimento do tio Fulbert. Ao saber do ocorrido, o tio de Heloise, desejoso de vingança contrata capangas e manda castrar Abelardo. Assim, o filósofo se vê obrigado a desistir do amor por Heloise tornando-se padre sendo acompanhado por ela ao entrar para o convento. Porém, o amor não cessa e os amantes passam a escrever um ao outro cartas carregadas de declarações amorosas. A ligação entre os dois permaneceu pós-túmulo, pois, Abelardo e Heloise foram enterrados lado a lado.

Nesta bela e apaixonante narrativa é possível encontrar marcas fortes do movimento literário intitulado Romantismo no que concerne, não somente à história de amor proibido – ponto chave nos romances históricos como Romeu e Julieta ou Helena e Páris -, mas também, os detalhes do período literário como a concretização do amor somente após a morte ou o escapismo do amor pela religião ou ainda, o fato de viver um amor suprimido e por ele sofrer revoluções de espírito.

Desse modo, no filme “Em nome de Deus”, isto é, na história de Abelardo e Heloise, percebe-se a característica da morte como único meio possível para viver o amor quando a moça apaixonada, já vestindo o hábito por certo tempo, pede para quando ele falecer que ela possa, novamente, se deitar na cama dele, no qual recebe de resposta um sim. Nota-se, assim, a forte presença romântica no aspecto de conduzir o amor eterno para o pós-túmulo, única alternativa para amar livre de empecilhos, característica presente nas poesias do movimento literário como “Partida” de Soares de Passos.


"Mas se as flores dos campos voltarem
Sem que eu volte co’as flores da vida,
Chora aquelle que em tumba esquecida
Dorme ao longe seu longo dormir;
E cada ano que o sopro do outono
Desfolhar a verdura do olmeiro,
Lembra-te inda do adeus derradeiro,
D’este adeus que te disse ao partir!" (Partida, Soares de Passos)


Há, também, um paralelo em contraste no filme e no Romantismo no que se refere à exaltação da nobreza do herói. No filme, Abelardo não abandona Heloise pela filosofia, nem abandona a filosofia por Heloise, assim, compreende-se que o homem romântico é nobre em cumprir com seus compromissos, neste caso, a profissão e o amor por uma mulher. Do mesmo modo, tanto Abelardo e Heloise, ao tornarem-se religiosos se respeitam mutuamente, conservando o amor somente por palavras e olhares. No Romantismo português, pode-se citar o romance de Alexandre Herculano como exemplo de nobreza: “Eurico, o presbítero” que privado de se casar com sua amada Hermengarda, prefere seguir o caminho da religião (escapismo) e ao estar com a amada nos braços não foge ao juramento de manter-se longe dos prazeres mundanos, das paixões, como a que sentia pela mulher em seus braços.

Neste ínterim, é plausível destacar também outra marca do Romantismo apresentada no filme: o escapismo para a religião. Abelardo é privado de amar Heloise, e, além disso, considera a paixão vivida até então como erro e por isso fora castigado, então, resolve tornar-se padre solicitando que a esposa também fuja para a religião. A obra já citada, “Eurico, o presbítero”, apresenta tal caractere romântico quando o herói Eurico entrega-se à religião após ser privado de casar com Hermengarda.

(Mais sobre o romance histórico em

http://pt.wikipedia.org/wiki/Eurico,_o_Presb%C3%ADtero)


Por fim, delineadas as proposições acerca do Romantismo português e o filme “Em nome de Deus”, é plausível considerar a produção cinematográfica uma peça fundamental para a análise do movimento literário, com suas concepções de amor eterno na pós-morte, do escapismo para a religião quando há privações amorosas e também, para caracterizar o herói romântico nobre de coração.

Um comentário:

Paula: pesponteando disse...

E como apreciei, Li. Andei um pouco pelas imagens do filme, me embalei no enredo, e revisitei as teorias românticas...Belo texto...bjs

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